As maltodextrinas são
produtos da hidrólise parcial do amido e têm sido largamente utilizadas em muitos
tipos de alimentos processados e fórmulas infantis, por seu sabor levemente adocicado, logo o que seu consumo excessivo pode ocasionar aos lactentes?
A maltodextrina em excesso pode prejudicar a percepção
organoléptica de lactentes?
Sim, muita maltodextrina pode interferir dramaticamente na percepção
organoléptica de lactentes, uma vez que tende a ser mais doce que a lactose
naturalmente presente no leite humano e no leite de vaca, além de aumentar a
viscosidade e se degradar lentamente no trato digestivo dando mais saciedade ao
bebê, favorecendo a curto prazo o desmame precoce, problemas como excesso de
peso e etc. Essas questões podem gerar influências negativas na formação de hábitos
e preferências alimentares com inquietantes desdobramentos a saúde infantil.
Fundamentação
bromatológica:
Uma infant formula,
supostamente, deveria articular ingredientes cuja mistura resultasse numa
composição química muito próxima da composição química do leite materno,
nutriente a nutriente, inclusive em termos de valor biológico. Nesse contexto,
a fonte de carboidrato deveria ser predominantemente a lactose, que também é
predominante no leite de vaca - ainda que noutros percentuais.
O
carboidrato em maior quantidade no leite materno é a lactose, com cerca de 80%,
os demais 20% representam oligossacarídeos, com três à dez monossacarídeos em
sua estrutura numa combinação que inclui 5 componentes.
As fórmulas infantis, por motivos variados fazem uso de
outros carboidratos associando-os ou não a lactose. Pode ser a sacarose, maltodextrina, para tornar o produto
mais doce e aceitável pelo bebê, induzindo-os a preferência pelo sabor doce;
podem ser gomas ou amidos, com fim de espessamento, visando enfrentar o
fenômeno da regurgitação; e dentre outras finalidades, pode também ser um
oligossacarídeo com propriedades bifidogênicas, para melhor “imitar” o leite
humano e justificar questões de rotulagem.
Legislação:
A última versão da
norma brasileira de comercialização, a resolução da diretoria colegiada da
Agência Nacional de Vigilância Sanitária – RDC n°43/44 de 19 de setembro de
2011, com nova redação dada pela Resolução – RDC n° 46/47 de 25 de setembro de
2014 fomenta que somente a lactose, a maltose, a sacarose, a glicose, a maltodextrina, o xarope de glicose, o
xarope de glicose desidratado e os amidos estão permitidos como carboidratos em
fórmulas infantis e sua utilização devem atender aos requisitos dispostos na
mesma.
Os requisitos propostos por ambas as
normas (Codex e Anvisa) estabelece um conteúdo mínimo de carboidratos totais de
9,0 g/100 Kcal e máximo de 14,0 g/100 Kcal. Quando amidos forem utilizados
somente serão aceitos amidos gelatinizados ou pré-cozidos naturalmente isentos
de glúten, até o máximo de 30% do total de carboidratos.
Discussão/Apresentação:
As
maltodextrinas são produtos da hidrólise parcial do amido e têm sido largamente
usadas em muitos tipos de alimentos processados. São classificadas de acordo
com o grau de hidrólise do amido e possuem várias propriedades funcionais, como
doçura, solubilidade e viscosidade.
O recém-nascido tem papilas gustativas
espalhadas por grande parte da boca, numa área até mais extensa do que os
adultos. Além da língua, há papilas gustativas até nas amígdalas e no fundo da
garganta, que propicia que ao longo
dos primeiros três meses fora da barriga, o bebê consiga distinguir o sabor
agradável do doce de sabores desagradáveis azedos e amargos.
As
fórmulas infantis foram criadas com a finalidade de se assemelhar ao leite
materno, no entanto sua composição não se iguala as propriedades fisiológicas
do leite humano, que são específicas de mãe para filho. As fontes de
carboidratos, proteínas e outros componentes presentes nas fórmulas infantis
diferem em identidade e qualidade dos componentes do leite humano.
Assim sendo, é bem
contraditório que produtos que anunciam mimetizar o leite materno, sejam tão
diferentes entre si, inclusive naquilo que é mais primal, que é o conteúdo
e a natureza de suas proteínas e de seus carboidratos.
No contexto das fórmulas infantis, observa-se que as mesmas em vez de
convergirem para serem todas o mais similar possível ao leite materno e
consequentemente cada vez mais similares entre si, elas inversamente procuram
se diferenciar cada vez mais uma das outras. Diferenciam-se adicionando
substâncias que inspiram alegações nutricionais de saúde, mas também porque
muitas das vezes o carboidrato utilizado muita das vezes não é a lactose,
tampouco a proteína a lactoalbumina encontrada no leite humano.
Logo, a competitividade gerada por
este fenômeno entre os fabricantes está ajudando a revelar novas necessidades
em vigilância sanitária, uma vez que o Codex
Alimentarius e a Anvisa não pensaram previamente na tendência apresentada,
além disso a regulação vigente, embora até recente, já não dá conta das novas
situações apresentadas.
Conclusão:
Diante do exposto, há de se ter
certo cuidado no uso e consumo desse carboidrato em fórmulas e produtos
alimentícios infantis, mantendo o alerta, uma vez que se trata de um
carboidrato com alto índice glicêmico, que ainda que com menos poder adoçante
que a sacarose, induz a mesma ativação cerebral que a mesma segundo alguns
estudos. Logo, aparentemente em excesso fará o mesmo mal que ele.
Referências Bibliográficas:
ANVISA. RDC N° 43, DE 19 DE SETEMBRO DE 2011. Regulamento Técnico para Fórmula Infantil
para Lactentes. Disponível em: < http://portal.anvisa.gov.br/documents/33916/394219/RDC%2B43%2Balterada%2Bpela%2B46_2014%2Bok.pdf/faef9da8-6701-414b-b74c-c3cb61a49371>
Acesso em 18.04.2019.
ANVISA. RDC N° 44, DE 19 DE SETEMBRO DE 2011. Regulamento Técnico para Fórmulas Infantis
de Segmento para Lactentes. Disponível em: <http://portal.anvisa.gov.br/documents/33916/394219/RDC%2B44%2Balterada%2Bpela%2B47_2014%2Bok.pdf/046d56c1-9c4a-4662-8268-57d920bbf607>
Acesso em 18.04.2019.
Carvalho, L.E. R; Dias, M. Fórmulas e Alimentos
Infantis – Identidades, Rótulos e Legislação. In: Amamentação – Bases
Científicas. 2ª ed. Guanabara Koogan, 2005.
Codex Alimentarius. STANDARD FOR INFANT FORMULA
AND FORMULAS FOR SPECIAL MEDICAL PURPOSES INTENDED FOR INFANTS. CODEX STAN 72-1981. Revision: 2007. Disponível em: <http://www.fao.org/fao-who-codexalimentarius/shproxy/en/?lnk=1&url=https%253A%252F%252Fworkspace.fao.org%252Fsites%252Fcodex%252FStandards%252FCODEX%2BSTAN%2B72-1981%252FCXS_072e.pdf.> Acessado em: 20.04.2019.
MALTODEXTRINAS CARACTERÍSTICAS ESTRUTURAIS E APLICAÇÕES.
Disponível em: <http://aditivosingredientes.com.br/upload_arquivos/201603/2016030046347001459191801.pdf.>. Acesso em 19.04.2019.
Renata Monteiro. Norma brasileira de comercialização de alimentos para
lactentes e crianças de primeira infância: histórico, limitações e
perspectivas. Revista Panamericana de Salud Pública. v. 19; n.5,
2006.
4 comentários:
A Organização mundial de saúde (OMS) divulgou em 2019 o estudo “A study of the availability, composition and marketing of baby foods in four European countries” com o objetivo de analisar os rótulos de alimentos para crianças de zero a 36 meses. Os resultados mostraram os alimentos infantis há uma alta concentração de gorduras, sal e açúcares e que há uma falta de direcionamento adequado a faixa etária e indicação correta para os produtos.
Ao se observar os rótulos de infant formulas destaca-se a maltodextrina como aditivos alimentares, que é um polímero de glicose de alta densidade que possui um alto índice glicêmico. É preocupante inserir nesse tipo de alimento destinado a crianças em primeira infância que promovem uma quantidade excessiva de açúcar em quase todos os alimentos que pode ser viciante. Estudos científicos mostram que as crianças com menos de dois anos expostas ao açúcar são mais sujeitas a de consumi-lo em excesso.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) em 2016 se observa que 41 milhões de crianças com idade inferior a cinco anos têm excesso de peso ou são obesas e estima que em 2025, crianças obesas chegarão a 75 milhões. Dessa forma, o uso de aditivos como a Maltodextrina devem ser cada vez mais usados com cautela fornecendo a informação adequada nos rótulos da alimentação infantil.
referencias
who.int/dietphysicalactivity/childhood/en/
http://www.blog.saude.gov.br/index.php/promocao-da-saude/54034-a-obesidade-infantil-e-um-problema-serio-e-traz-riscos-para-a-saude-adulta
https://www.euro.who.int/en/health-topics/disease-prevention/nutrition/publications/2019/commercial-foods-for-infants-and-young-children-in-the-who-european-region-2019
Concordo que seja extremamente contraditório as fórmulas infantis se dizerem iguais ao leite materno, uma vez que não apresentam os mesmos carboidratos e mesmas proteínas. Algumas fórmulas infantis, que não são para intolerantes a lactose, apresentam maltodextrina como única fonte de carboidrato, e não a lactose que é o carboidrato presente no leite materno. Um exemplo de fórmula com a maltodextrina e sem lactose é a Nestogeno 1.
A maltodextrina também tem pontos positivos, não só na substituição da lactose em fórmulas para intolerante, mas também por fornecer energia com pouco efeito na osmolaridade (evitando diarreia e má absorção nos bebês) e por ser menos suscetíveis a fermentação por bactérias intestinais e auxiliar na absorção de Cálcio, Magnésio e Zinco. Entretanto, isso não compensa o fato de estar associado com vício gerado pela exposição de açúcar a crianças abaixo de dois anos, que traz problemas de obesidade na infância, como dito no comentário anterior da Caroline Felix, mas também diabetes, que podem aparecer no futuro.
Isso corrobora com o fato do consumo em excesso de maltodextrina e das fórmulas infantis pelas crianças ser algo preocupante, principalmente, sem que haja orientação e acompanhamento por um pediatra.
É interessante notar como o conceito de Infant Formula, que é produzir um composto que seja o mais similar possível ao leite materno, se torna vago quando paramos para analisar a quantidade de componentes que são adicionados à esse composto. O leite materno não possui somente a lactose como carboidrato, onde é encontrado outros açúcares, como a galactose e a frutose, por exemplo, porém é esperado uma predominância desse açúcar (lactose) no leite. Adicionar outros carboidratos, como a maltodextrina, para tornar o sabor mais agradável para o bebê, pode ser um risco devido à alta quantidade de açúcar ingerido. Isso pode se tornar um problema de saúde infantil, visto que uma criança pode desenvolver Diabetes Mellitus tipo 1. Também é observada a alteração da proteína encontrada predominantemente no leite materno, onde a lactoalbumina é substituída pela caseína. Vale citar também um grande risco que o marketing de vendas faz em querer transformar um Infant Formula em um produto mais vantajoso que o leite materno, porém sabe-se que o leite materno traz benefícios para o bebê, principalmente substâncias que participam no desenvolvimento e na produção de energia. A concorrência de marcas faz com que os produtos Infant Formula fiquem mais diferentes possíveis uns dos outros, e consequentemente, mais diferente do leite materno.
Complementando os outros comentários, essa contradição entre a definição de infant formula e o que realmente chega às prateleiras é preocupante, principalmente se considerarmos que o consumidor final é um bebê. Mesmo partindo do princípio de que não há como reproduzir de maneira idêntica o conteúdo do leite materno, a adição de substâncias como a maltodextrina e proteínas (como o comentário do João Paulo ressaltou) não encontradas no "produto original" parece não ter fundamento. A competição entre diferentes marcas leva a disputas entre fórmulas que parecem se distanciar cada vez mais da composição do leite materno, entretanto isso evidencia o fato de que a legislação precisa ser atualizada para regulamentar de maneira mais eficiente esse produto.
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