Apresentação

Gerar, disseminar e debater informações sobre BABY FOOD, sob enfoque de Saúde Pública, é o objetivo principal deste Blog produzido no Laboratório de Vida Urbana, Consumo & Saúde - LabConsS da FF/UFRJ, com participação de alunos da disciplina “Química Bromatológica” e com apoio e monitoramento técnico dos bolsistas e egressos do Grupo PET-Programa de Educação Tutorial da SESu/MEC.

Recomenda-se que as postagens sejam lidas junto com os comentários a elas anexados, pois algumas são produzidas por estudantes em circunstâncias de treinamento e capacitação para atuação em Assuntos Regulatórios, enquanto outras envolvem poderosas influências de marketing, com alegações raramente comprovadas pela Ciencia. Esses equívocos, imprecisões e desvios ficam evidenciados nos comentários em anexo.

domingo, 30 de junho de 2019

Maltodextrinas nas infant fómulas.

       As maltodextrinas são produtos da hidrólise parcial do amido e têm sido largamente utilizadas em muitos tipos de alimentos processados e fórmulas infantis, por seu sabor levemente adocicado, logo o que seu consumo excessivo pode ocasionar aos lactentes?




       A maltodextrina em excesso pode prejudicar a percepção organoléptica de lactentes?

       Sim, muita maltodextrina pode interferir dramaticamente na percepção organoléptica de lactentes, uma vez que tende a ser mais doce que a lactose naturalmente presente no leite humano e no leite de vaca, além de aumentar a viscosidade e se degradar lentamente no trato digestivo dando mais saciedade ao bebê, favorecendo a curto prazo o desmame precoce, problemas como excesso de peso e etc. Essas questões podem gerar influências negativas na formação de hábitos e preferências alimentares com inquietantes desdobramentos a saúde infantil.
  
 Fundamentação bromatológica:

          Uma infant formula, supostamente, deveria articular ingredientes cuja mistura resultasse numa composição química muito próxima da composição química do leite materno, nutriente a nutriente, inclusive em termos de valor biológico. Nesse contexto, a fonte de carboidrato deveria ser predominantemente a lactose, que também é predominante no leite de vaca  -  ainda que noutros percentuais.
           O carboidrato em maior quantidade no leite materno é a lactose, com cerca de 80%, os demais 20% representam oligossacarídeos, com três à dez monossacarídeos em sua estrutura numa combinação que inclui 5 componentes.
         As fórmulas infantis, por motivos variados fazem uso de outros carboidratos associando-os ou não a lactose. Pode ser a sacarose, maltodextrina, para tornar o produto mais doce e aceitável pelo bebê, induzindo-os a preferência pelo sabor doce; podem ser gomas ou amidos, com fim de espessamento, visando enfrentar o fenômeno da regurgitação; e dentre outras finalidades, pode também ser um oligossacarídeo com propriedades bifidogênicas, para melhor “imitar” o leite humano e justificar questões de rotulagem.      

Legislação:

A última versão da norma brasileira de comercialização, a resolução da diretoria colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – RDC n°43/44 de 19 de setembro de 2011, com nova redação dada pela Resolução – RDC n° 46/47 de 25 de setembro de 2014 fomenta que somente a lactose, a maltose, a sacarose, a glicose, a maltodextrina, o xarope de glicose, o xarope de glicose desidratado e os amidos estão permitidos como carboidratos em fórmulas infantis e sua utilização devem atender aos requisitos dispostos na mesma. 
        Os requisitos propostos por ambas as normas (Codex e Anvisa) estabelece um conteúdo mínimo de carboidratos totais de 9,0 g/100 Kcal e máximo de 14,0 g/100 Kcal. Quando amidos forem utilizados somente serão aceitos amidos gelatinizados ou pré-cozidos naturalmente isentos de glúten, até o máximo de 30% do total de carboidratos.

Discussão/Apresentação:    
As maltodextrinas são produtos da hidrólise parcial do amido e têm sido largamente usadas em muitos tipos de alimentos processados. São classificadas de acordo com o grau de hidrólise do amido e possuem várias propriedades funcionais, como doçura, solubilidade e viscosidade.
O recém-nascido tem papilas gustativas espalhadas por grande parte da boca, numa área até mais extensa do que os adultos. Além da língua, há papilas gustativas até nas amígdalas e no fundo da garganta, que propicia que ao longo dos primeiros três meses fora da barriga, o bebê consiga distinguir o sabor agradável do doce de sabores desagradáveis azedos e amargos.
As fórmulas infantis foram criadas com a finalidade de se assemelhar ao leite materno, no entanto sua composição não se iguala as propriedades fisiológicas do leite humano, que são específicas de mãe para filho. As fontes de carboidratos, proteínas e outros componentes presentes nas fórmulas infantis diferem em identidade e qualidade dos componentes do leite humano.
Assim sendo, é bem contraditório que produtos que anunciam mimetizar o leite materno, sejam tão diferentes entre si, inclusive naquilo que é mais primal, que é o  conteúdo e a natureza de suas proteínas e de seus carboidratos.
         No contexto das fórmulas infantis, observa-se que as mesmas em vez de convergirem para serem todas o mais similar possível ao leite materno e consequentemente cada vez mais similares entre si, elas inversamente procuram se diferenciar cada vez mais uma das outras. Diferenciam-se adicionando substâncias que inspiram alegações nutricionais de saúde, mas também porque muitas das vezes o carboidrato utilizado muita das vezes não é a lactose, tampouco a proteína a lactoalbumina encontrada no leite humano.
         Logo, a competitividade gerada por este fenômeno entre os fabricantes está ajudando a revelar novas necessidades em vigilância sanitária, uma vez que o Codex Alimentarius e a Anvisa não pensaram previamente na tendência apresentada, além disso a regulação vigente, embora até recente, já não dá conta das novas situações apresentadas.  
 

Conclusão:
            Diante do exposto, há de se ter certo cuidado no uso e consumo desse carboidrato em fórmulas e produtos alimentícios infantis, mantendo o alerta, uma vez que se trata de um carboidrato com alto índice glicêmico, que ainda que com menos poder adoçante que a sacarose, induz a mesma ativação cerebral que a mesma segundo alguns estudos. Logo, aparentemente em excesso fará o mesmo mal que ele.
   



 Referências Bibliográficas:

ANVISA. RDC N° 43, DE 19 DE SETEMBRO DE 2011. Regulamento Técnico para Fórmula Infantil para Lactentes. Disponível em: < http://portal.anvisa.gov.br/documents/33916/394219/RDC%2B43%2Balterada%2Bpela%2B46_2014%2Bok.pdf/faef9da8-6701-414b-b74c-c3cb61a49371> Acesso em 18.04.2019.

ANVISA. RDC N° 44, DE 19 DE SETEMBRO DE 2011. Regulamento Técnico para Fórmulas Infantis de Segmento para Lactentes.  Disponível em: <http://portal.anvisa.gov.br/documents/33916/394219/RDC%2B44%2Balterada%2Bpela%2B47_2014%2Bok.pdf/046d56c1-9c4a-4662-8268-57d920bbf607> Acesso em 18.04.2019.

Carvalho, L.E. R; Dias, M. Fórmulas e Alimentos Infantis – Identidades, Rótulos e Legislação. In: Amamentação – Bases Científicas. 2ª ed. Guanabara Koogan, 2005.  

Codex Alimentarius. STANDARD FOR INFANT FORMULA AND FORMULAS FOR SPECIAL MEDICAL PURPOSES INTENDED FOR INFANTS. CODEX STAN 72-1981. Revision: 2007.  Disponível em: <http://www.fao.org/fao-who-codexalimentarius/shproxy/en/?lnk=1&url=https%253A%252F%252Fworkspace.fao.org%252Fsites%252Fcodex%252FStandards%252FCODEX%2BSTAN%2B72-1981%252FCXS_072e.pdf.> Acessado em: 20.04.2019.

MALTODEXTRINAS CARACTERÍSTICAS ESTRUTURAIS E APLICAÇÕES. Disponível em: <http://aditivosingredientes.com.br/upload_arquivos/201603/2016030046347001459191801.pdf.>. Acesso em 19.04.2019.

Renata Monteiro. Norma brasileira de comercialização de alimentos para lactentes e crianças de primeira infância: histórico, limitações e perspectivas. Revista Panamericana de Salud Pública. v. 19; n.5, 2006.

4 comentários:

Caroline Felix disse...

A Organização mundial de saúde (OMS) divulgou em 2019 o estudo “A study of the availability, composition and marketing of baby foods in four European countries” com o objetivo de analisar os rótulos de alimentos para crianças de zero a 36 meses. Os resultados mostraram os alimentos infantis há uma alta concentração de gorduras, sal e açúcares e que há uma falta de direcionamento adequado a faixa etária e indicação correta para os produtos.
Ao se observar os rótulos de infant formulas destaca-se a maltodextrina como aditivos alimentares, que é um polímero de glicose de alta densidade que possui um alto índice glicêmico. É preocupante inserir nesse tipo de alimento destinado a crianças em primeira infância que promovem uma quantidade excessiva de açúcar em quase todos os alimentos que pode ser viciante. Estudos científicos mostram que as crianças com menos de dois anos expostas ao açúcar são mais sujeitas a de consumi-lo em excesso.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) em 2016 se observa que 41 milhões de crianças com idade inferior a cinco anos têm excesso de peso ou são obesas e estima que em 2025, crianças obesas chegarão a 75 milhões. Dessa forma, o uso de aditivos como a Maltodextrina devem ser cada vez mais usados com cautela fornecendo a informação adequada nos rótulos da alimentação infantil.
referencias
who.int/dietphysicalactivity/childhood/en/
http://www.blog.saude.gov.br/index.php/promocao-da-saude/54034-a-obesidade-infantil-e-um-problema-serio-e-traz-riscos-para-a-saude-adulta
https://www.euro.who.int/en/health-topics/disease-prevention/nutrition/publications/2019/commercial-foods-for-infants-and-young-children-in-the-who-european-region-2019

Maria Luíza H Peixoto disse...

Concordo que seja extremamente contraditório as fórmulas infantis se dizerem iguais ao leite materno, uma vez que não apresentam os mesmos carboidratos e mesmas proteínas. Algumas fórmulas infantis, que não são para intolerantes a lactose, apresentam maltodextrina como única fonte de carboidrato, e não a lactose que é o carboidrato presente no leite materno. Um exemplo de fórmula com a maltodextrina e sem lactose é a Nestogeno 1.
A maltodextrina também tem pontos positivos, não só na substituição da lactose em fórmulas para intolerante, mas também por fornecer energia com pouco efeito na osmolaridade (evitando diarreia e má absorção nos bebês) e por ser menos suscetíveis a fermentação por bactérias intestinais e auxiliar na absorção de Cálcio, Magnésio e Zinco. Entretanto, isso não compensa o fato de estar associado com vício gerado pela exposição de açúcar a crianças abaixo de dois anos, que traz problemas de obesidade na infância, como dito no comentário anterior da Caroline Felix, mas também diabetes, que podem aparecer no futuro.
Isso corrobora com o fato do consumo em excesso de maltodextrina e das fórmulas infantis pelas crianças ser algo preocupante, principalmente, sem que haja orientação e acompanhamento por um pediatra.

João Paulo Rodrigues disse...

É interessante notar como o conceito de Infant Formula, que é produzir um composto que seja o mais similar possível ao leite materno, se torna vago quando paramos para analisar a quantidade de componentes que são adicionados à esse composto. O leite materno não possui somente a lactose como carboidrato, onde é encontrado outros açúcares, como a galactose e a frutose, por exemplo, porém é esperado uma predominância desse açúcar (lactose) no leite. Adicionar outros carboidratos, como a maltodextrina, para tornar o sabor mais agradável para o bebê, pode ser um risco devido à alta quantidade de açúcar ingerido. Isso pode se tornar um problema de saúde infantil, visto que uma criança pode desenvolver Diabetes Mellitus tipo 1. Também é observada a alteração da proteína encontrada predominantemente no leite materno, onde a lactoalbumina é substituída pela caseína. Vale citar também um grande risco que o marketing de vendas faz em querer transformar um Infant Formula em um produto mais vantajoso que o leite materno, porém sabe-se que o leite materno traz benefícios para o bebê, principalmente substâncias que participam no desenvolvimento e na produção de energia. A concorrência de marcas faz com que os produtos Infant Formula fiquem mais diferentes possíveis uns dos outros, e consequentemente, mais diferente do leite materno.

Ana Clara da Silva disse...

Complementando os outros comentários, essa contradição entre a definição de infant formula e o que realmente chega às prateleiras é preocupante, principalmente se considerarmos que o consumidor final é um bebê. Mesmo partindo do princípio de que não há como reproduzir de maneira idêntica o conteúdo do leite materno, a adição de substâncias como a maltodextrina e proteínas (como o comentário do João Paulo ressaltou) não encontradas no "produto original" parece não ter fundamento. A competição entre diferentes marcas leva a disputas entre fórmulas que parecem se distanciar cada vez mais da composição do leite materno, entretanto isso evidencia o fato de que a legislação precisa ser atualizada para regulamentar de maneira mais eficiente esse produto.